terça-feira, 30 de outubro de 2012

ENCERRAMENTO DO SÍNODO


Notícias do Sínodo dos Bispos 22 - Pe. Lima

               O grande evento eclesial do Sínodo dos Bispos de 2012 foi encerrado com a solene liturgia eucarística, presidida pelo Papa e concelebrado pela maioria de seus participantes. Foi a quarta grande e bela liturgia da qual participamos durante o Sínodo. Como informei durante as três semanas, os únicos momentos de oração em comum dos cerca de 400 participantes, eram:
               1. No início da manhã a récita da hora média da Liturgia das Horas (tércia) também com certa solenidade, quer pelos salmos todos cantados (a assembleia alternava com parte do coro da capela sistina presente), quer pela leitura breve com todos os ritos solenes da missa (entrada da Palavra de Deus ladeada pelos ceruferários) e proclamação solene do texto bíblico. Seguia-se uma homilia de 8 a 10 minutos proferida no primeiro dia pelo Papa, e depois por um dos padres sinodais (a penúltima, na sexta feira passada foi feita pelo brasileiro Dom Benedito Beni, bispo de Lorena, em italiano). Após a oração final, sempre se cantava uma das cinco antífonas tradicionais de Nossa Senhora, sempre em latim.
               2. No início da sessão da tarde, rezava-se apenas uma simples oração de início de trabalho (Actiones nostras ou uma oração pelo bom êxito do Sínodo).
               Entretando, quatro belíssimas e concorridíssimas Eucaristias, foram celebradas pelo Papa; concelebramos a primeira e última, e participamos da segunda e terceira. A primeira foi a abertura no dia 06 de Outubro; a segunda, no dia 11, comemorando os 50 anos do Concílio, 20 anos do Catecismo da Igreja Católica e abertura do Ano da Fé; a terceira foi no domingo dia 22, quando foram canonizados 7 santos de diversa procedência, cultura e que viveram modalidades diferentes de evangelização. A quarta e última, foi a Eucaristia de Conclusão do Sínodo, ontem, dia 28. As três primeiras, pelo seu caráter multitudinário, foram celebradas na Praça São Pedro, ao passo que a última foi dentro da maravilhosa Basílica Vaticana.
               Entretanto, o imenso espaço litúrgico da Basílica Patriarcal do Vaticano tornou-se pequeno para acolher a grande quantidade de celebrantes e fieis que lá compareceram. Muitos tiveram que participar fora da basílica, através dos telões. Estavam presentes a quase maioria dos 400 participantes do Sínodo, cardeais, bispos, sacerdotes, revestidos dos paramentos solenes. Como sempre destacavam-se os de rito oriental, pomposos em seus trajes litúrgicos.
               O momento sempre esperado é a homilia do Papa. E dessa vez, como sempre ele fez um magistral comentário ao texto da liturgia dominical (cego Bartimeu), falando da cegueira de muitas pessoas que vivem em regiões de antiga evangelização, onde a luz da fé se ofuscou, e se afastaram de Deus, deixando de considerá-Lo relevante para a própria vida e, portanto, necessitados de uma Nova Evangelização: “São as inúmeras pessoas que precisam de uma nova evangelização, isto é, de um novo encontro com Jesus, o Cristo, o Filho de Deus que pode voltar a abrir os seus olhos, a ensinar-lhes o caminho”. Não só para essas pessoas é necessária uma nova evangelização; ela é para toda a Igreja, que deve ser animada pelo fogo do Espírito.A partir de aí fez uma interessante síntese dos trabalhos conciliares, relevando esses três pontos:
1. O primeiro diz respeito à vida interna da Igreja, aos Sacramentos da Iniciação cristã. "É necessário fazer uma catequese que realmente inicie as pessoas (adultos, jovens e crianças) no mistério de Jesus, de tal modo que sejam bem preparadas para receber os três sacramentos: Batismo, Confirmação e Eucaristia". É interessante notar que, quando Bento XVI se refere a esses sacramentos, ele usa sempre essa ordem: batismo, confirmação e eucaristia, que não é a tradicional. Creio que ele pensa que deveríamos alterar a sequência dos sacramentos de iniciação cristã! Ao lado deles, está a importância do Sacramento da Penitência (tão acentuada durante o Sínodo) e a vida dos Santos, verdadeiros protagonistas da nova evangelização, através dos exemplos de vida que nos dão.
2. O segundo ponto da Nova Evangelização, conforme Bento XVI, é a missão ad gentes (aos povos pagãos), para a qual são chamados consagrados e leigos. Assim se expressou: “Foi afirmado, durante o Sínodo, que há muitos ambientes na África, Ásia e Oceania, onde os habitantes aguardam com viva expectativa – às vezes sem estar plenamente conscientes disso – o primeiro anuncio do Evangelho. Por isso é preciso pedir ao Espírito Santo que suscite na Igreja um renovado dinamismo missionário, cujos protagonistas sejam, de modo especial, os agentes pastorais e féis leigos”. Tal tipo de evangelização é facilitada pela globalização e a deslocação de populações dentro ou fora do país; os migrantes têm possibilidade de levar sua fé onde quer que estejam.
3. O terceiro ponto da nova evangelização diz respeito às pessoas batizadas, mas que não vivem as exigências do Batismo. Tais pessoas encontram-se em todos os continentes, especialmente nos mais secularizados. "A Igreja dedica-lhes uma atenção especial, para que encontrem de novo Jesus Cristo, redescubram a alegria da fé e voltem à prática religiosa na comunidade dos fiéis. Para além dos métodos tradicionais de pastoral, sempre válidos, a Igreja procura lançar mão de novos métodos, valendo-se também de novas linguagens, apropriadas às diversas culturas do mundo, para implementar um diálogo de simpatia e amizade que se fundamenta em Deus que é Amor". Para isso a Igreja se serve dos métodos tradicionais de pastoral e procura novos métodos, novas linguagens mais apropriadas para as diversas culturas do mundo. "O Pátio dos Gentios", assim como a "missão continental" mostram o esforço de criatividade pastoral para realizar essa missão.
            Voltando ao cego Bartimeu, curado por Jesus, Bento XVI concluiu dizendo: "Assim são os novos evangelizadores: pessoas que fizeram a experiência de ser curadas por Deus, através de Jesus Cristo".
            Como nas três missas anteriores, também nessa o rito foi soleníssimo, brilhou o coro da Capela Sistina, afinadíssimo e com novas e modernas melodias, conduzido pelo maestro salesiano Pe. Massimo Palombela. A orquestra de metais, novamente deu grande solenidade a Rito. Ao final da celebração, o diácono, ao invés de cantar a tradicional despedida, usou essas palavras: "A missa terminou, ide em paz anunciar o Evangelho".
            Com essas palavras concluiu-se a XIII Assembleia Geral Ordinária dos Bispos, cada um retornando às próprias bases, com a sensação do dever cumprido, animados e cheios de entusiasmo, para não só como pessoas trabalharem na nova evangelização, mas sobretudo para serem animadores de seus irmãos no árduo e empenhativo trabalho de uma Nova Evangelização.
Roma, 29 de Outubro de 2012, segunda feira
 Pe. Luiz Alves de Lima, sdb.

"O fogo de Deus, à semelhança dum fogo em brasas, pede para ser reavivado"


Homilia do Papa na missa de conclusão do Sínodo dos Bispos
CIDADE DO VATICANO, domingo, 28 de outubro de 2012 (ZENIT.org) - Publicamos a seguir a homilia do Papa Bento XVI na Missa celebrada na basílica vaticana por ocasião da conclusão da XIII Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos com o tema "A nova evangelização para a transmissão da fé cristã".
***
Venerados Irmãos,
Ilustres Senhores e Senhoras,
Amados irmãos e irmãs!
O milagre da cura do cego Bartimeu ocupa uma posição significativa na estrutura do Evangelho de Marcos. De facto, está colocado no fim da secção designada «viagem para Jerusalém», isto é, a última peregrinação de Jesus para a Cidade Santa, para a Páscoa em que, como Ele sabe, O aguardam a paixão, a morte e a ressurreição. Para subir a Jerusalém a partir do vale do Jordão, Jesus passa por Jericó, e o encontro com Bartimeu tem lugar à saída da cidade, «quando – observa o evangelista – [Jesus] ia a sair de Jericó com os seus discípulos e uma grande multidão» (10, 46), a mesma multidão que, dali a pouco, aclamará Jesus como Messias na sua entrada em Jerusalém. Precisamente na estrada estava sentado a mendigar Bartimeu, cujo nome significa «filho de Timeu», como diz o próprio evangelista. Todo o Evangelho de Marcos é um itinerário de fé, que se desenvolve gradualmente na escola de Jesus. Os discípulos são os primeiros actores deste percurso de descoberta, mas há ainda outros personagens que desempenham papel importante, e Bartimeu é um deles. A sua cura prodigiosa é a última que Jesus realiza antes da sua paixão, e não é por acaso que se trata da cura dum cego, isto é, duma pessoa cujos olhos perderam a luz. A partir de outros textos, sabemos também que a condição de cegueira tem um significado denso nos Evangelhos. Representa o homem que tem necessidade da luz de Deus – a luz da fé – para conhecer verdadeiramente a realidade e caminhar pela estrada da vida. Condição essencial é reconhecer-se cego, necessitado desta luz; caso contrário, permanece-se cego para sempre (cf. Jo 9, 39-41).
Situado naquele ponto estratégico da narração de Marcos, Bartimeu é apresentado como modelo. Ele não é cego de nascença, mas perdeu a vista: é o homem que perdeu a luz e está ciente disso, mas não perdeu a esperança, sabe agarrar a possibilidade deste encontro com Jesus e confia-se a Ele para ser curado. Na realidade, ouvindo dizer que o Mestre passa pela sua estrada, grita: «Jesus, filho de David, tem misericórdia de mim!» (Mc 10, 47), e repete-o vigorosamente (v. 48) E quando Jesus o chama e lhe pergunta que quer d’Ele, responde: «Mestre, que eu veja!» (v. 51). Bartimeu representa o homem que reconhece o seu mal, e grita ao Senhor com a confiança de ser curado. A sua imploração, simples e sincera, é exemplar, tendo entrado na tradição da oração cristã da mesma forma que a súplica do publicano no templo: «Ó Deus, tem piedade de mim, que sou pecador» (Lc 18, 13). No encontro com Cristo, vivido com fé, Bartimeu readquire a luz que havia perdido e, com ela, a plenitude da sua própria dignidade: põe-se de pé e retoma o caminho, que desde então tem um guia, Jesus, e uma estrada, a mesma que Jesus percorre. O evangelista não nos diz mais nada de Bartimeu, mas nele mostra-nos quem é o discípulo: aquele que, com a luz da fé, segue Jesus «pelo caminho» (v. 52).
Num dos seus escritos, Santo Agostinho observa um particular acerca da figura de Bartimeu, que pode ser interessante e significativo também hoje para nós. O santo Bispo de Hipona reflecte sobre o facto de Marcos referir, neste caso, não só o nome da pessoa que é curada, mas também de seu pai, e chega à conclusão de que «Bartimeu, filho de Timeu, era um personagem decaído duma situação de grande prosperidade, e a sua condição de miséria devia ser universalmente conhecida e de domínio público, enquanto não era apenas cego, mas um mendigo que estava sentado na berma da estrada. Por esta razão, Marcos não o quis recordar só a ele, porque o facto de ter recuperado a vista conferiu ao milagre tão grande ressonância como grande era a fama da desventura que atingira o cego» (O consenso dos evangelistas, 2, 65, 125: PL 34, 1138) . Assim escreve Santo Agostinho!
Esta interpretação de Bartimeu como pessoa decaída duma condição de «grande prosperidade» é sugestiva, convidando-nos a reflectir sobre o facto que há riquezas preciosas na nossa vida que podemos perder e que não são materiais. Nesta perspectiva, Bartimeu poderia representar aqueles que vivem em regiões de antiga evangelização, onde a luz da fé se debilitou, e se afastaram de Deus, deixando de O considerarem relevante na própria vida: são pessoas que deste modo perderam uma grande riqueza, «decaíram» duma alta dignidade – não económica ou de poder terreno, mas a dignidade cristã –, perderam a orientação segura e firme da vida e tornaram-se, muitas vezes inconscientemente, mendigos do sentido da existência. São as inúmeras pessoas que precisam de uma nova evangelização, isto é, de um novo encontro com Jesus, o Cristo, o Filho de Deus (cf. Mc 1, 1), que pode voltar a abrir os seus olhos e ensinar-lhes a estrada. É significativo que, no momento em que concluímos a Assembleia sinodal sobre a Nova Evangelização, a Liturgia nos proponha o Evangelho de Bartimeu. Esta Palavra de Deus tem algo a dizer de modo particular a nós que nestes dias nos debruçamos sobre a urgência de anunciar novamente Cristo onde a luz da fé se debilitou, onde o fogo de Deus, à semelhança dum fogo em brasas, pede para ser reavivado a fim de se tornar chama viva que dá luz e calor a toda a casa.
A nova evangelização diz respeito a toda a vida da Igreja. Refere-se, em primeiro lugar, à pastoral ordinária que deve ser mais animada pelo fogo do Espírito a fim de incendiar os corações dos fiéis que frequentam regularmente a comunidade reunindo-se no dia do Senhor para se alimentarem da sua Palavra e do Pão de vida eterna. Aqui gostaria de sublinhar três linhas pastorais que emergiram do Sínodo. A primeira diz respeito aos Sacramentos da iniciação cristã. Foi reafirmada a necessidade de acompanhar, com uma catequese adequada, a preparação para o Baptismo, a Confirmação e a Eucaristia; e reiterou-se também a importância da Penitência, sacramento da misericórdia de Deus. É através deste itinerário sacramental que passa o chamamento do Senhor à santidade, que é dirigido a todos os cristãos. Na realidade, várias vezes se repetiu que os verdadeiros protagonistas da nova evangelização são os santos: eles falam, com o exemplo da vida e as obras da caridade, uma linguagem compreensível a todos.
Em segundo lugar, a nova evangelização está essencialmente ligada à missão ad gentes. A Igreja tem o dever de evangelizar, de anunciar a mensagem da salvação aos homens que ainda não conhecem Jesus Cristo. No decurso das próprias reflexões sinodais, foi sublinhado que há muitos ambientes em África, na Ásia e na Oceânia, onde os habitantes aguardam com viva expectativa – às vezes sem estar plenamente conscientes disso – o primeiro anúncio do Evangelho. Por isso, é preciso pedir ao Espírito Santo que suscite na Igreja um renovado dinamismo missionário, cujos protagonistas sejam, de modo especial, os agentes pastorais e os fiéis leigos. A globalização provocou um notável deslocamento de populações, pelo que se impõe a necessidade do primeiro anúncio também nos países de antiga evangelização. Todos os homens têm o direito de conhecer Jesus Cristo e o seu Evangelho; e a isso corresponde o dever dos cristãos – de todos os cristãos: sacerdotes, religiosos e leigos – de anunciarem a Boa Nova.
Um terceiro aspecto diz respeito às pessoas baptizadas que, porém, não vivem as exigências do Baptismo. Durante os trabalhos sinodais, foi posto em evidência que estas pessoas se encontram em todos os continentes, especialmente nos países mais secularizados. A Igreja dedica-lhes uma atenção especial, para que encontrem de novo Jesus Cristo, redescubram a alegria da fé e voltem à prática religiosa na comunidade dos fiéis. Para além dos métodos tradicionais de pastoral, sempre válidos, a Igreja procura lançar mão de novos métodos, valendo-se também de novas linguagens, apropriadas às diversas culturas do mundo, para implementar um diálogo de simpatia e amizade que se fundamenta em Deus que é Amor. Em várias partes do mundo, a Igreja já encetou este caminho de criatividade pastoral para se aproximar das pessoas afastadas ou à procura do sentido da vida, da felicidade e, em última instância, de Deus. Recordamos algumas missões urbanas importantes, o «Átrio dos Gentios», a missão continental, etc.. Não há dúvida que o Senhor, Bom Pastor, abençoará abundantemente estes esforços que nascem do zelo pela sua Pessoa e pelo seu Evangelho.
Queridos irmãos e irmãs, Bartimeu, uma vez obtida novamente a vista graças a Jesus, juntou-se à multidão dos discípulos, entre os quais havia seguramente outros que, como ele, foram curados pelo Mestre. Assim são os novos evangelizadores: pessoas que fizeram a experiência de ser curadas por Deus, através de Jesus Cristo. Eles têm como característica a alegria do coração, que diz com o Salmista: «O Senhor fez por nós grandes coisas; por isso, exultamos de alegria» (Sal 126/125, 3). Com jubilosa gratidão, hoje também nós nos dirigimos ao Senhor Jesus, Redemptor hominis e Lumen gentium, fazendo nossa uma oração de São Clemente de Alexandria: «Até agora errei na esperança de encontrar Deus, mas porque Vós me iluminais, ó Senhor, encontro Deus por meio de Vós, e de Vós recebo o Pai, torno-me herdeiro convosco, porque não Vos envergonhastes de me ter por irmão. Cancelemos, portanto, cancelemos o esquecimento da verdade, a ignorância; e, removendo as trevas que nos impedem de ver como a névoa nos olhos, contemplemos o verdadeiro Deus...; já que, sobre nós sepultados nas trevas e prisioneiros da sombra da morte, brilhou uma luz do céu [luz] mais pura que o sol, mais doce que a vida nesta terra » (Protrettico, 113, 2–114, 1). Amen.
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segunda-feira, 29 de outubro de 2012

Últimas notícias do SINODO DOS BISPOS


APROVADAS AS PROPOSIÇÕES E ENCERRADAS AS SESSÕES DO SÍNODO
Uma reviravolta no texto sobre catequese... muito melhor!
               Chegamos finalmente à última sessão da XIII Assembleia Geral Ordinária dos Bispos. Foram 22 sessões plenárias e 4 reuniões dos Circuli Minori. Ouvimos um total de 429 intervenções (discursos). O Sínodo produziu 2 grandes documentos: a Mensagem ao Povo de Deus, um pouco longa, mas cheia de conteúdo e numa linguagem bastante coloquial, incisiva, esperançosa e otimista. E o elenco das 58 Proposições (ao final foi acrescentada mais uma), texto de muito conteúdo, e consequentemente com linguagem mais formal, declarativa e um tanto técnica. Elas recolhem o que de melhor foi abordado ao longo das três semanas de trabalho.
               Conforme uma prática já consolidada desde o primeiro sínodo e posteriormente confirmada, essa assembleia episcopal não faz um documento, do tipo, por exemplo, das Diretrizes Gerais ou do Diretório Nacional de Catequese. De fato, essas Proposições não possuem uma finalidade em si, mas são entregues ao Papa para que ele, assessorado pela Comissão Permanente para o Sínodo, renovada nessa Assembleia por votação, redija uma Exortação Apostólica a ser apresentada a toda a Igreja. Daí o segredo e a reserva sobre tal documento. A outra razão, mais citada, é que o Sínodo é um organismo consultivo e não tem poder de decisão... Isso, a meu ver, enfraquece aquela finalidade de colegialidade pela qual o Sínodo foi criado!
               As proposições são grandes afirmações, em linguagem sintética, a respeito de um problema importante referente ao tema principal, no nosso caso, a Nova Evangelização para a transmissão da fé. E por serem "entregues" ao Papa, são cercadas do máximo segredo... como já tive oportunidade de falar.
               Mas, no mundo de hoje, é difícil guardar segredo. Por isso, desde que Bento XVI assumiu o pontificado romano, ele autorizou a publicação, em versão oficiosa e não oficial, dessas Proposições. Assim, já está sendo veiculado na Internet o elenco das 58 Proposições, inicialmente em inglês (língua em que foram escritas, pois o Relator Geral, Dom Donald W. Wuerl, é americano), e logo em seguida certamente surgirão traduções, se é que já não foram feitas! Pelo que consta, nem o Osservatore Romano e muito menos outro órgão oficial da Santa Sé irão publicadas: são reservadas ao Papa! Ele esteve presente quase o tempo todo, e hoje,na alocução ao meio dia (no Angelus), disse:
               "De minha parte, ouvi e tomei nota de muitos itens de reflexão e muitas propostas que, com a ajuda da Secretaria do Sínodo e de meus colaboradores, procurarei colocar em ordem e elaborar, para oferecer à toda a Igreja, uma síntese orgânica e indicações coerentes. Podemos dizer que deste Sínodo sai reforçado o empenho pela renovação espiritual da mesma Igreja, para poder renovar espiritualmente o mundo secularizado. Tal renovação virá da redescoberta de Jesus Cristo, da sua verdade e da sua graça, do seu rosto, tão humano e ao mesmo tempo tão divino, sobre o qual resplandece o mistério transcendente de Deus".
               A última sessão foi bastante longa. Inicialmente, o Secretário Geral comunicou os três nomes indicados pelo Papa para completar o Conselho Permanente do Sínodo: Card. Donald William Wuerl (relator geral desse Sínodo), o Card. Salvador Fisichella e Dom Pedro Herkulan Malchuk, ofm, arcebispo de Kiev. Informa que dos 12 grupos linguísticos vieram 529 propostas de alterações nas 57 proposições, que agora são 58; foram integradas na medida em que corrigiam, aperfeiçoavam ou ampliavam o texto anterior.
               A seguir, tanto o Relator Geral (D. W. Wuerl), como o Secretário Especial (P.-M. Carré) prosseguiram a leitura, iniciada ontem, das Proposições, em sua segunda edição definitiva. Durante a leitura nós, assessores, tivemos o privilégio de receber uma cópia... milagre! E também fomos somente nós que ficamos com elas, pois a cópia que os bispos receberam foram devolvidas ao final, com a própria votação. Assim, pudemos acompanhar melhor e perceber mais concretamente onde houve alterações.
               Terminada a longa e pausada leitura, houve a votação eletrônica, com três alternativas: Placet (voto positivo),  Non placet (voto negativo) e Absentio (abstenção). Dos 260 padres sinodais, no máximo 251 votaram, pois um ou outro se ausentava por algum motivo, ou mesmo já tinham viajado, ou se emaranhavam nas teclas do controle (hipótese mais plausível)...
               A sala do Sínodo é muito bem equipada com os modernos recursos eletrônicos, como já acontece em muitos lugares. Do próprio lugar, através de uma espécie de controle remoto, cada um fazia sua votação e o resultado era imediatamente exibido nos telões. Houve aprovação de todos as proposições. Deve ter havido alguma falha nos equipamentos, pois sempre havia 1 voto negativo ou uma abstenção, até para Proposições que falavam da Santíssima Trindade como fonte da Nova Evangelização, ou sobre Nossa Senhora, Estrela da Nova Evangelização... isso chegou a provocar risos entre os votantes...
               Como já disse, o que mais me chamou a atenção (e nem poderia deixar de ser...), foi o número 29 que, na redação anterior falava apenas do catecismo. Fiquei contentíssimo, pois a proposta que eu fizera no grupo linguístico foi plenamente acolhido, e, também pela "pressão" de outros grupos, a proposição ficou totalmente reformulada. O texto que falava do catecismo foi bastante reduzido, ficando no final, e acrescentados, no início, três parágrafos, para nós, importantíssimos, pois falam da catequese, do catequista e ainda (surpresa!), acrescentou uma abertura para o reconhecimento do ministério do catequista. Certamente foi a Proposição que mais recebeu radical mudança, o que explica também o elevado número de votos negativos (mas nem tanto...)
               De fato, no momento da votação deste no. 29, que trata da catequese, participaram 250 votantes. Foi aprovado por larga maioria, ou seja: 229 placet, 17 non placet e 3 Abstenções. Aliás, todas as proposições foram aprovadas assim, com ampla maioria. Outras proposições que receberam pouquíssimos non placet foram: 17. Preâmbulos da fé e teologia da credibilidade: 18 non placet e 5 abstenções; 18. NE e mídia: 16 non p. e 2 abs.; 20. NE e via da beleza: 15 non p. e 6 abs.; 30. A teologia: 19 non p. e 2 abs.; 33. Sacramento da Penitência e NE: 12 non p. e 2 abs.; 37. O Sacramento da Confirmação na NE: 18 non p. e 6 abs.; 38. A Iniciação Cristã e NE: 13 non p. e 5 abs.; 40. O novo Conselho para a NE:16 non p. e 8 abs.;  43. Os dons hierárquicos e carismáticos: 20 non p. e 7 abs.; 46. A cooperação de homens e mulheres na Igreja: 17 non p. e 6 abs.; 52. Diálogo ecumênico: 14 non p. e 4 abs.; 53. Diálogo entre as religiões: 20 e 5 abs.; 54. Diálogo entre ciência e fé: 14 non p. e 2 abs.; 55. Átrio dos gentios: 20 e 3 abs.; 56. O cuidado da criação: 11 non p. e 3 abs.
               Além desse no. 29, sobre a catequese, catequistas e catecismo, há vários outros que tocam no tema da catequese, como o no. 28 A catequese de adultos, que recebeu 240 placet, 8 non p. e 2 abs.; o no. 37. O Sacramento da Confirmação na NE: 18 non p. e 6 abs.; e ainda o no. 38. A Iniciação Cristã e a Nova Evangelização: 13 non p. e 5 abs. Ao falar da família, no no. 48, os pais e os avós são exortados a educarem as crianças e adolescentes na fé. Por fim, quando se fala da formação sacerdotal no no. 49 A dimensão pastoral do ministério ordenado, pede-se que os futuros sacerdotes sejam formados "na capacidade de comunicar-se na catequese".
               Na sessão da tarde, a última das 22 que tivemos, além dos discursos formais de agradecimentos, saudações e augúrios, o Papa espontaneamente tomou a palavra e confirmou que a escolha dos 6 novos cardeais, foi para ampliar mais a representação da catolicidade da Igreja, pois a maioria deles são de regiões onde não há representação cardinalícia. E a segunda notícia, para nós foi mais importante. Disse Bento XVI que, depois de muito refletir, rezar e consultar seus assessores, ele resolveu fazer pequena modificação nas competências de duas Congregações da Cúria Romana: passar o cuidado dos seminários para a Congregação para o Clero (estava antes na Congregação para a Educação Católica) e passar a animação da catequese (que estava na Congregação para o Clero), para o novo Pontifício Conselho para a Nova Evangelização. Tais notícias foram recebidas com muito aplauso, e eu, pessoalmente, achei excelente, pois a catequese encontra, dentro da estrutura governamental da Igreja, um lugar bem mais significativo e próprio, pois profundamente ligado à Evangelização. Esta notícia estava na primeira página do Osservatore Romano de hoje, e, naturalmente já circulando na Internet! O encarregado por desse Pontifício Conselho para a Nova Evangelização é Dom Salvador Fisichella, teólogo bastante conceituado nos dias de hoje.
               Apresento novamente o título das 58 Proposições aprovadas, pois houve modificações significativas, assinaladas com o tipo itálico:
Introdução: 1. Documentos a serem enviados ao Papa; 2. Agradecimentos do Sínodo. 3. Sobre as Igrejas Católicas Orientais para a NE.
Capítulo I: A Natureza da Nova Evangelização
4. A Santíssima Trindade, fonte da Nova Evangelização
5. A Nova Evangelização e a inculturação
6. A proclamação do Evangelho
7. Nova Evangelização como aspecto da missão permanente da Igreja\
8. Testemunhas num mundo secularizado
9. A Nova Evangelização e o Primeiro Anúncio
10. O direito de proclamar e ouvir o Evangelho
11. A Nova Evangelização e a leitura orante da Sagrada Escritura
12. Os documentos do Concílio Vaticano II
Cap. II: O contexto do Ministério da Igreja hoje
13. As provocações da nossa época
14. A Nova Evangelização e a Reconciliação
15. A Nova Evangelização e os direitos humanos
16. A liberdade religiosa
17. Os preâmbulos da fé e a teologia da credibilidade
18. A Nova Evangelização e as comunicações sociais
19. A Nova Evangelização e a promoção humana
20. A Nova Evangelização e a via da beleza
21. As migrações
22. A conversão
23. A santidade e os novos evangelizadores
24. A doutrina Social da Igreja
25. Cenários urbanos da Nova Evangelização
Capítulo III - As respostas pastorais para as circunstâncias de hoje
26. As Paróquias e outros contextos eclesiais
27. A educação
28. A catequese de adultos
29. A catequese, os catequistas e o catecismo
30. A Teologia
31. A Nova Evangelização e a opção pelos pobres
32. Os enfermos
33. O Sacramento da Penitência e a Nova Evangelização
34. O domingo e dias festivos
35. A Liturgia
36. A dimensão espiritual da Nova Evangelização
37. O Sacramento da Confirmação na Nova Evangelização
38. A Iniciação Cristã e a Nova Evangelização
39. A piedade popular e a Nova Evangelização
40. O Pontifício Conselho para a promoção da Nova Evangelização
Capítulo IV - Agentes e participantes da Nova Evangelização
41. A Nova Evangelização e a Igreja Particular
42. A atividade pastoral integrada
43. Os dons hierárquicos e carismáticos
44. A Nova Evangelização na Paróquia
45. O papel dos fieis leigos na Nova Evangelização
46. A cooperação dos homens e das mulheres na Igreja
47. A formação dos Evangelizadores
48. A família cristã
49. A dimensão pastoral do ministério ordenado
50. A vida consagrada
51. Os jovens e a Nova Evangelização
52. O diálogo Ecumênico
53. O diálogo inter-religioso
54. O diálogo entre ciência e fé
55. O átrio dos gentios
56. O meio ambiente
57. A fé cristã que deve ser transmitida
Conclusão: 58. Maria, Estrela da Nova Evangelização.

Roma, 28 de Outubro de 2012, Domingo - ENCERRAMENTO DO SÍNODO
Pe. Luiz Alves de Lima, sdb.

sábado, 27 de outubro de 2012

Palavras do Papa Término dos trabalhos do Sínodo dos Bispos



Sala do Sínodo - Vaticano
Sábado, 27 de outubro de 2012

Queridos irmãos e irmãs,

Antes de agradecer da minha parte, gostaria ainda de fazer um comunicado. 

No contexto das reflexões do Sínodo dos Bispos, “A Nova Evangelização para a transmissão da fé cristã”, e a conclusão de um caminho de reflexões sobre temáticas dos Seminários e da Catequese, tenho o prazer de anunciar que decidi, depois de oração e reflexão, transferir a competência sobre Seminários da Congregação para a Educação Católica à Congregação para o Clero e a competência sobre Catequese da Congregação para o Clero ao Pontifício Conselho para a Promoção da Nova Evangelização. 

Seguirão os documentos relativos em forma de Carta Apostólica Motu Proprio para definir os âmbitos e as respectivas faculdades. Oremos ao Senhor para que acompanhe os três Dicastérios da Cúria Romana na sua importante missão, com a colaboração de toda a Igreja. 

Tendo já a palavra, também gostaria de exprimir as minhas cordiais saudações aos novos Cardeais. Eu quis, com este pequeno Consistório, completar o Consistório de fevereiro, próprio no contexto da Nova Evangelização, com um gesto de universalidade da Igreja, mostrando que a Igreja é Igreja de todos os povos, fala em todas as línguas, é sempre Igreja de Pentecoste; não Igreja de um Continente, mas Igreja universal. Esta era propriamente a minha intenção, de exprimir este contexto, esta universalidade da Igreja; é também a bela expressão deste Sínodo. Para mim, foi verdadeiramente edificante, reconfortante e encorajante ver aqui o espelho da Igreja universal com os seus sofrimentos, ameaças, perigos e alegrias, experiência da presença do Senhor também em situações difíceis. 

Ouvimos como a Igreja também hoje cresce, vive. Penso, por exemplo, em quanto nos foi dito sobre Camboja, onde de novo nasce a Igreja, a fé; ou também sobre Noruega, e tantos outros. Vemos também como hoje, onde não se esperava, o Senhor está presente e poderoso e o Senhor opera também através do nosso trabalho e das nossas reflexões.

Mesmo se a Igreja sente ventos contrários, todavia sente, sobretudo, o vento do Espírito Santo que nos ajuda, nos mostra o caminho certo; e assim, com novo entusiasmo, me parece, estamos no caminho e agradecemos ao Senhor porque nos deu este encontro verdadeiramente católico. 

Agradeço a todos: os Padres do Sínodo, os Auditores, com o testemunho sempre verdadeiramente muito comovente, os Peritos, os Delegados fraternos que nos ajudaram; e sabemos que todos queremos anunciar Cristo e o seu Evangelho e lutar, neste tempo difícil, pela presença da verdade de Cristo e pelo seu anúncio. 

Sobretudo gostaria de agradecer os nossos Presidentes que nos guiaram com doçura e firmeza, os Relatores que trabalharam dia e noite. Penso sempre que seja um pouco contra o direito natural trabalhar também de noite, mas se o fazemos voluntariamente podemos agradecer e devemos sentir-nos gratos; e, naturalmente, o nosso Secretário geral, incansável e cheio de ideias. 

Agora estas Proposições são um testamento, um dom, dado a mim por nós, para elaborar tudo em um documento que vem da vida e deve gerar vida. Sobre isto esperamos e oramos; em cada caso, vamos adiante com a ajuda do Senhor. Obrigado a vós todos. Com muitos nos vemos em novembro – penso no Consistório. Obrigado. 

sexta-feira, 26 de outubro de 2012

Notícias do Sínodo dos Bispos 19 - Pe. Lima RUMO À CONCLUSÃO DO SÍNODO


Segunda Redação das PROPOSITIONES e Testemunhos
              
               Os antigos diziam: Motus in fine velocior - o movimento no final é mais veloz. É o que acontece também no Sínodo. No final as coisas se precipitam. Hoje foi um dia intenso durante o qual desanuviaram-se alguns receios e temores, dando lugar a um pouco mais de esperança de que houve progresso em alguns pontos e não regresso, como até ontem parecia.
               Dom Giuseppe Betori, arcebispo de Florença, iniciou pela manhã a apresentação da 2a. redação da Mensagem, por ser seu relator. Disse que foram mais de 300 sugestões apresentadas. Dada a aprovação maciça da primeira redação, agora foram integradas as observações que não alteravam a estrutura e o conteúdo essencial. Foram eliminadas as repetições e alguma retórica (na verdade, esse trabalho eu já havia feito na síntese que enviei nas crônicas 13, 14 e 15). Assim sendo, o texto propriamente ficou muito semelhante àquele já enviado.
               Algumas observações: o trecho sobre as comunicações sociais (estava no no. 4 e foi para o no. 10) ficou mais ampliado. O no. 6 foi completamente reformulado acentuando mais o fenômeno da secularização e dando maior importância ao fenômeno da presença do estado na vida moderna (hegemonia estatal), com os desafios de aí advindos para a evangelização. O no. 7 dedicado à família teve acréscimos, porém a expressão "comunhão eclesial... que não é negada aos casais de segunda união", foi mudada por: "continuam sendo membros da Igreja, embora não possam receber a absolvição sacramental nem a Eucaristia". Os no.s 8 (religiosidade popular) e 9 (jovens) foram ampliados. As maiores modificações foram no longo no. 10 (o Evangelho em diálogo com a cultura e a experiência humana e as religiões), no no. 13 (Igrejas Orientais Católicas). Sobre os continentes: no texto sobre a África foi mais bem aproveitada a imagem da família; América Latina: separou-se o tema "pluralismo religioso" do tema "violência"; Ásia: acrescentou-se que aí encontra-se a Terra Santa; Europa: ao invés de dizer "continente ferido durante decênios pelo poder comunista" preferiu-se falar em "decênios de poder de ideologias inimigas de Deus e do homem".
               A leitura da nova redação da Mensagem foi distribuída nas 5 línguas oficiais; como o português não é língua oficial, mas para dar importância ao Brasil, foi pedido a Dom Sérgio Rocha, arcebispo de Brasília, para ler o texto referente à América Latina; seu castelhano estava excelente...
               Um novo e longo aplauso foi interpretado como aprovação integral da Assembleia à nova redação. Essa segunda leitura do texto inteiro da Mensagem permitiu apreciar melhor sua beleza e oportunidade, embora ainda permaneça um pouco longo... Mas creio que vale a pena: é um texto que manifesta as grandes linhas de reflexão desenvolvidas durante o Sínodo.
               Já o texto das proposições, continua a ser guardado a sete chaves. Como informei, sua primeira aparição foi apenas em inglês e num latim bastante clássico e difícil; mas, pelo menos, todos os participantes tinham o texto impresso. Hoje não: apenas os bispos (ou seja, aqueles que votam) receberam o texto unicamente em latim. E foi-nos chamada a atenção sobre o que está escrito na primeira e segunda capas: sub secreto, texto sob segredo, reservadíssimo. O Secretário Geral, Dom Eterovic, reclamou que conteúdos substanciais foram parar em blogs na internet... Daí também porque, em crônicas anteriores, não desci a detalhes, mas apresentei apenas os 57 títulos.
               A segunda versão de hoje trazia 58 Proposições (conforme informou o Relator; não sei qual proposição foi acrescentada, pois não tive acesso ao texto!). Foram lidas as primeiras 34: uma leitura meio monótona, com o carregado sotaque americano do Relator Principal e o sotaque francês do Secretário Especial... Houve momentos em que os roncos de alguns dorminhocos se fizeram ouvir... acompanhar a leitura de um texto em latim, sem tê-lo na frente, e também sem os conhecimentos das clássicas construções latinas... não há quem resista! Deve-se reconhecer, entretanto, que Dom Donald W. Wuerl e Dom Pierre-Marie Carré fizeram o trabalho hercúleo de preparar, no espaço de um dia e meio, quando muito, a integração de 529 propostas de modificações apresentadas pelos 12 grupos. Um dos que ouviam atentamente, e até fazendo observações escritas no texto, sem pestanejar, era Bento XVI, para quem, naturalmente, o latim é tão familiar quanto o alemão!
               Por sorte eu havia trazido a primeira versão, apresentada três dias atrás, e pude acompanhar, percebendo e anotando as várias alterações, supressões, acréscimos que foram introduzidos, e, graças a Deus, sempre para melhor! Foram poucas as proposições que não foram retocadas. Quando se chegou ao no. 29, aquele que falava unicamente do catecismo sem nomear a catequese nem os catequistas, tive que me conter para não manifestar minha surpresa e alegria. O texto foi totalmente remodelado, acrescentando uma frase sobre a catequese e outra sobre os catequistas, bastante significativa, que eu havia apresentado em meu grupo (através de Dom Odilo, como disse ontem) e que certamente recebeu a pressão de vários outros grupos. Mas minha surpresa não parou aí; veio embutida também uma citação do documento Ministeria Quaedam de Paulo VI sobre a reforma dos ministérios ordenados, dando uma pequena abertura para a instituição do ministério da catequese!
               Vários membros de meu grupo, inclusive o bispo relator, Dom Renato Blázquez Pérez, vieram me manifestar a satisfação por verem nossa proposta aceita. Foi uma verdadeira vitória: a catequese, dentro do quadro geral da Nova Evangelização, estava suficientemente salva. Diante dessa vitória, nem dei importância à outra proposta que havia feito sobre a alteração da ordem de apresentação dos assuntos e que não foi aceita. Continua, pois, valendo a observação da Ir. Beatriz Casiello (SCALA): "Me llama la atención la falta de orden de la 3ra.parte". Procurei corrigir, mas… não deu!
               No final da leitura dos 32 números, Dom Nikola Eterovic pediu aos bispos que levassem o texto para completarem individualmente a leitura e já assinalarem nos respectivos lugares, o próprio voto: Placet (positivo), Non Placet (negativo).
               O dia foi completado pelos 16 discursos (ainda!) de ouvintes que pediram a palavra e não puderam falar até hoje. O primeiro a falar foi o Patriarca Ortodoxo da Sérvia, Dr. Irinej, Bispo de Backa. Falou muito bem, denunciando o ritualismo e formalismo da catequese na Igreja Ortodoxa; falou de "cadáveres espirituais" dentro da Igreja e que "a Nova Evangelização se faz necessária primeiramente dentro da própria Igreja". Falou também a sucessora da Bv. Madre Tereza de Calcutá, Ir. Mary Prema Pierick, sobre a NE junto aos pobres. Chamou a atenção vários testemunhos de vida cristã dados por leigos e leigas principalmente em países de pouca tradição cristã, ou que vivem situações difíceis, como em Cuba ou em países mulçumanos. Dois participantes do Movimento Focolari falaram da própria forma de evangelizar entre os excluídos e marginalizados da sociedade nesses ambientes.
               A Superiora Geral das Filhas de Maria Auxiliadora, madre Ivone Reungoat, falou da dimensão evangelizadora da vida religiosa: "não devemos ser somente crentes, mas críveis". Acentuou também o caráter pedagógico da evangelização e a "necessária mediação cultural e educativa capaz de entrar nos cenários do mundo contemporâneo para oferecer aos jovens e aos mais pobres propostas de crescimento humano e cristão". O Dr. Simón Castellví, presidente da Federação Internacional das Associações Médicas Católicas, denunciou as tramas abortistas da fundação Bill Gates e fez a proposta de um "plano Marshall a favor da maternidade" e defendeu uma maior "atenção obstétrica básica" às mães pobres. E iríamos longe, se fossemos retratar a riqueza e variedade desses últimos pronunciamentos do Sínodo, embora não vão influenciar em nada os dois documentos já prontos, a Mensagem e as Propositiones.
               Amanhã teremos as duas últimas sessões, com aprovação formal das 58 proposições, e no domingo, a solene conclusão com a grande concelebração eucarística na Basílica São Pedro, presidida pelo Papa Bento XVI.

Roma, 26 de Outubro de 2012, Quinta feira.
Pe. Luiz Alves de Lima, sdb.

Arte e Fé


Visita à Capela Sistina e pré-estreia do filme Via Pulchritudinis

              
               Antes de ontem, durante a reunião dos grupos linguísticos foi anunciado que o Papa nomeou mais seis cardeais, entre eles um latino-americano, Dom Rubén Salazar Gómez, arcebispo de Bogotá - Colômbia. Chamou atenção também o fato de dois deles serem de países com populações muçulmanas significativas: Beatitude Bechara Boutros Rai, de 72 anos, patriarca da Igreja Católica Maronita do Líbano e Dom John Olorunfemi Onaiyekan, 68 anos, arcebispo de Abuja, Nigéria. Esse anúncio, proclamado durante a audiência das quartas feiras, foi uma surpresa, quer pelo pequeno número de nomeados, quer por estar fora de época. Isso levou a especulações sobre a saúde do Papa; outros disseram que o Papa simplesmente está completando as vagas deixadas pelos últimos cardeais que faleceram. O consistório, ou seja, a cerimônia do "empossamento" dos novos cardeais, será em 24 de novembro próximo.
               Durante o dia de hoje, o Relator Geral do Sínodo, Dom Donald William Wuerl e os 12 relatores dos grupos linguísticos passaram o dia concluindo a revisão e dando os últimos retoques nas 57 proposições à luz do que sugeriram ontem os 12 grupos. Os outros, tivemos um dia livre.
               Foi-nos proporcionada uma visita à célebre Capela Sistina, um dos monumentos de arte mais importantes da humanidade. No próximo dia 30 de Outubro essa Capela estará completando 500 anos. De fato, foi no dia 30 de Outubro de 1512 que o Papa Júlio II, della Rovere, inaugurou os afrescos pintados na imensa abóbada da Capela. Essa monumental obra foi realizada por Michelangelo entre 1508 e 1512. O Papa quis marcar o V centenário dessa obra prima de arte, em nível mundial, com uma cerimônia especial.
            Nós, participantes do Sínodo, tivemos muita sorte, pois a Capela foi fechada somente para nós (normalmente ela está repleta de turistas), e tivemos a companhia não só do Diretor do Museu do Vaticano, mas também a guia de especialistas que nos contaram os mínimos particulares da grandiloquente obra, sua história, técnicas de pintura, e, sobretudo, o significado religioso e teológico do grande monumento.
            Após explicar-nos as paredes laterais, com afrescos belíssimos de vários artistas daquele momento, retratando cenas do Antigo e do Novo Testamento, a atenção voltou-se para a abóbada onde Michelangelo perpetuou em refinadíssima arte e maestria, cenas da História da Salvação. E, como gran finale da visita, ficamos quase que uma hora somente analisando e apreciando o imenso painel do Juízo Final, fruto da maturidade de Michelangelo, pois ele o pintou 20 anos depois que havia concluído as obras da abóbada.
            Ao lado das lições de arte e história, fomos também informados dos vários ritos que se desenrolam ao longo de uma eleição pontifícia naquele ambiente sagrado. Fomos até levados à sala do pranto, uma espécie de antiga sacristia, mas muito pequena, para onde é levado o cardeal que é eleito papa, onde em geral ele chora (daí o nome) de emoção e de temor diante das grandes responsabilidades que está assumindo... Aí também ele prova as vestes pontificais, feitas em três medidas diferentes, para imediatamente ser apresentado depois ao Povo, já revestido das insígnias papais.
            Saindo da Capela Sistina fomos imediatamente para a grande Sala Paulo VI, onde há as audiências da quarta feira, e foi então projetada a ante-estreia oficial de um filme especialmente realizado para comemorar os 500 anos da Capela Sistina, os 50 anos do Concílio Vaticano II e em homenagem ao Papa e aos padres sinodais. Como essa sala é imensa, a projeção foi aberta também ao clero, religiosos e religiosas de Roma, e pessoas mais ligadas à Igreja.
            O filme é intitulado Fé e Arte, e se refere a um tema que também emergiu nas discussões do Sínodo, ou seja: o caminho da beleza (via pulchritudinis), como uma das possibilidades da Nova Evangelização. O filme mostra como ao longo de 20 séculos, os cristãos souberam expressar a própria fé em Jesus Cristo, na Igreja, na santidade de vida, através da arte mais refinada e requintada. E como também a Igreja, e particularmente o Museu Vaticano, único no mundo, por suas dimensões e pelo acervo de obras artísticas que contêm, se tornou o guardião das maiores obras primas do gênio religioso da humanidade.
            Naturalmente, a obra de arte mais mostrada e comentada ao longo do filme, é justamente a Capela Sistina. Assim, aquilo que tínhamos visto ao vivo e a cores na própria Capela, pudemos ver agora, em seus mínimos detalhes, projetado no grande telão da Sala Paulo VI.
            O filme, em forma de documentário, do diretor Pawel Pitera, foi produzido pelo Museu do Vaticano, realizado por um canal televisivo polaco, com o apoio da Ordem Militar de Malta. O Papa esteve presente na projeção (e por causa de seu cansaço e idade o filme foi um pouco diminuído), e ao final fez um pequeno discurso que definiu o Museu do Vaticano, e consequentemente o filme, como "um concentrado de teologia por imagens", sublinhando assim a sua missão cultural e espiritual: "O Museu mostra verdadeiramente um contínuo entrelaçamento entre Cristianismo e cultura, entre fé e arte, entre o divino e o humano".
            E, referindo-se ao filme, acrescentou: "Percorrendo a via Pulchritudinis, o caminho da Beleza, pode-se chegar à porta da fé. Mas para que este itinerário não seja privilégio de uns poucos, é importante que as imagens, bem como a narrativa humana que as acompanha, cheguem a um público cada vez mais vasto e diversificado. Para isso foi produzido um DVD, que, em 70 minutos, condensa com maestria 2000 anos de história da Igreja e da arte".
            Esse DVD será distribuído mundialmente a partir de novembro. E cada um de nós, participantes do Sínodo, tivemos a sorte de receber um exemplar, que, no mercado, custará 10 euros. Assim, antes de terminar o Sínodo, pudemos passar uma tarde mergulhados na beleza da arte, poderoso veículo para suscitar e alimentar a nossa fé.

Roma, 25 de Outubro de 2012, Quinta feira.
Pe. Luiz Alves de Lima, sdb.

quinta-feira, 25 de outubro de 2012

DISCUTINDO AS PROPOSIÇÕES


Trabalho nos Círculos Menores (Grupos)
              
               Hoje não ouve plenário. Todo o dia foi dedicado à discussão das 57 proposições nos 12 círculos menores, também chamados grupos linguísticos, pois nos reunimos por línguas que previamente havíamos escolhidos. Como já disse, fui como assessor no grupo Hispanicus A, bastante numeroso. A maioria era da América Latina (do Brasil estávamos Dom Odilo, Dom Geraldo Lírio e eu), alguns europeus (espanhóis) e outros de países africanos que falam português (Angola, Moçambique, São Tomé e Príncipe...).
               Continuou a reclamação da falta de uma tradução em língua mais compreensível já que dispomos apenas do inglês, traduzido para o latim extremamente clássico e difícil. Frequentemente era necessário recorrer ao inglês para entender o latim e vice versa: às a tradução latina expressava melhor a ideia do que o original inglês, ou a ideia estava melhor expressa em inglês que o latim. Eu mesmo tive a oportunidade de corrigir um título que trocava Ministerium por ministrum...
               As normas dadas para as discussões nos grupos linguísticos eram bastante rígidas. Não podíamos fazer propostas individuais por escrito; qualquer proposta deveria ser discutida e aprovada por maioria relativa, caso contrário não era aceita. As sugestões seriam apenas para "aperfeiçoar" os textos, sem mexer em seu sentido substancial nem na estrutura. Deveriam se restringir a mudar palavras, fazer citações e fazer pequenos acréscimos para melhorar a ideia já expressa. Como se vê, a redação das 57 proposições apresentadas nessa brochura intitulada "Elechus unicus propositionum" já vinha quase como pronta. O relator do grupo deveria tomar nota de tudo e levar para a reunião dos 12 relatores dos grupos amanhã, junto com a presidência, para elaborarem a redação final.
               Apesar de tantas restrições, o nosso grupo trabalhou a tarde de ontem, e nos dois períodos de hoje, manhã e tarde. Foi uma discussão bastante boa. Aparecia, como já havia sido notado, alguma diferença de experiências e mentalidades entre latino-americanos e africanos, e os europeus (espanhóis). Quando eu apresentei a proposta de trocar o título do no. 29 de "Catecismo" para "Catequese, catequistas e Catecismo", o mundo veio abaixo... protesto geral, pois o que o Sínodo queria era acentuar o valor do Catecismo da Igreja Católica e urgir o seu uso na catequese. Argumentei sobre a prevalência da fides qua (resposta pessoal, adesão à pessoa de Jesus) sobre a fides quae (conteúdo, doutrina), mas fui voto vencido. E o pior é que, em todo o Elenco das 57 proposições, não se fala da catequese em si explicitamente, nem dos catequistas. Alguém disse que o texto já falava dos leigos em geral, e isso bastava... imaginem!
               A questão do ministério dos catequistas definitivamente não passou, pelo menos no meu grupo. E no Plenário também eu já havia sentido uma resistência a essa ideia... Soube, por outras vias, que no neo-catecumenado os catequistas às vezes passam por cima da autoridade do padre e querem extrapolar seus limites. Daí o medo de alguns em reforçar tal realidade se por acaso a catequese fosse reconhecida como ministério...
            A todo momento eu dizia que determinado assunto estava fora de lugar... aliás, comentando minha crônica de ontem, alguns já me fizeram essa observação, através de e-mails, particularmente no cap. III. Então o Moderador (coordenador do grupo) pediu que eu fizesse, ao final, uma proposta e apresentasse no final da tarde por escrito uma nova disposição dos 15 números. Foi o que fiz, redistribuindo a matéria da seguinte ordem: 01 Liturgia; 02 Paróquias e outras realidades eclesiais; 03 Iniciação Cristã e NE; 04 Sacramento da Confirmação e a NE; 05 Catequese com Adultos; 06 Catecismo; 07 Sacramento da Penitência e NE; 08 Domingos e Festas; 09 Teologia; 10 Educação; 11A dimensão contemplativa da NE; 12 NE e opção pelos pobres; 13 Peregrinações e NE; 14 Enfermos; 15 Pontifício Conselho para promover a NE.
            A proposta foi aprovada. E também aproveitei para pedir a mudança do título 06 Catecismo, por Catequese, Catequistas e Catecismo. Como disse, em nenhum lugar se fala dos catequistas nem da catequese explicitamente. Com o apoio de Dom Odilo Scherer, Arcebispo de São Paulo, (a palavra de um cardeal pesa muito), conseguimos acrescentar nesse mesmo número, um parágrafo sobre o catequista, através de uma citação do Instrumento de Trabalho e modificando o título desse no. 6 para: Catequistas e Catecismo... O texto poderia ser muito mais aperfeiçoado, mas foi o que conseguimos. O trecho acrescentado foi:
            "Os catequistas são testemunhas diretas e evangelizadores insubstituíveis que representam a força basilar das comunidades cristãs. Têm necessidade que a Igreja reflita com maior profundidade sobre a sua missão, dando-lhes maior estabilidade, visibilidade ministerial e formação" (Instrumentum Laboris 108).
            Outros temas bastante discutidos e com modificações aceitas e integradas no texto foram: as relações entre fé e ciência, um pedido para a Santa Sé que dê orientações mais claras e precisas sobre a situação de casais de segunda união ou canonicamente irregulares, inspirando-se na tradição da Igreja Ortodoxa e de outras igrejas cristãs; o texto sobre as comunicações foi muito mais ampliado, não ficando apenas no uso instrumental, mas entrando na cultura midiática gerada ultimamente; deu-se maior importância às universidades e escolas católicas. O texto sobre a Liturgia foi muito mais ampliado e completado, graças à rica contribuição de Dom Geraldo Lírio, arcebispo de Mariana (MG).
            Sobre a ordem e sequência dos sacramentos da iniciação para os batizados na infância (batismo, crisma, eucaristia, ou eucaristia e crisma) o texto saiu pela tangente, citando novamente a Sacramentum Caritatis e remetendo o problema para as dioceses e conferências episcopais.
            Os trabalhos dos grupos terminaram um pouco mais cedo, de modo que todos puderam retornar antes do horário previsto, para suas residências, menos os 12 relatores dos círculos menores, que se reunirão com a equipe encarregada de unificar as preposições. Eles passarão amanhã todo o dia reunidos e trabalhando na segunda redação das Proposições para apresentá-las na sexta feira, quando haverá uma votação. Os outros, ganharemos um dia mais de vacat, ou seja de tempo livre durante toda a quinta feira.
            Ontem ouve a votação definitiva para a composição do Conselho do Sínodo, que irá ajudar o Papa a redigir a exortação apostólica sobre a Nova Evangelização, objeto de nossas reflexões e, depois, preparar o próximo Sínodo (2016 ou 2017). Foram 15 eleitos, três por continente. Para o continente americano foram eleitos: Dom Odilo Pedro Scherer, Cardeal Arcebispo de São Paulo (Brasil), Dom Santiago Jaime Silva Retamales, Bispo Auxiliar de Valparaiso (Chile) e Secretário Geral do CELAM e o Card. Timothy Michael Dolan, Arcebispo de New York (EUA).

Roma, 24 de Outubro de 2012, Quarta feira.
Pe. Luiz Alves de Lima, sdb.