terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

catequese de crisma e discipulado na fé - texto apresentado na CNBB

CATEQUESE DE CRISMA E DISCIPULADO DA FÉ

Pe. Paulo F. Dalla-Déa, fpm
paulo_fernando@hotmail.com

Problema prático: Como fazer para que o sacramento da maturidade não seja o sacramento da despedida da comunidade cristã?

1ª hipótese (mestrado): se o problema está nos jovens, qual a proposta da Igreja?

• Modelos de igreja – quais os tipos de Igreja estamos falando?
• Igreja e sociedade urbana: relação difícil (cidade: centro pulverizado ou vários centros, imaginário democrático, elemento surpresa...; Igreja: simbolismos rurais, excesso de ritualização, etc.).
• Documentos eclesiais:
o Vaticano 2º: jovens como apóstolos de outros; liturgia, catequese e missão unidas e articuladas.
o Medellín: problemas na linguagem; postura de diálogo, mas sem avanços significativos. O foco está na catequese e evangelização de adultos.
o Puebla: rostos latino-americanos de Cristo; jovens vítimas de ideologias, opção preferencial pelos jovens; a grande massa não é atingida na catequese; fidelidade ao homem latino-americano e catequese permanente (problema na leitura disto com relação aos adolescentes) como base para a inculturação de S.to Domingo.
o S.to Domingo: 10 vezes juventude e 7 adolescentes (distinção boa). Necessidade de acompanhamento espiritual. Inculturação (conceito e prática são diferentes). O tema dos jovens está inserido na realidade da Igreja. O documento fala de adolescentes que já estão na Igreja, não se preocupando muito com os que não estão nela (SD nº. 221). Pastoral vocacional junto com catequese de confirmação. Catequese vista como seguimento de Cristo.
o Evangelii Nuntiandi: promoção humana e evangelização juntas. 5 vezes jovens e 2 adolescentes. Critério da catequese: os evangelizados devem se tornar evangelizadores.
o Catechese Tradendae: santidade no mundo e em equipe. Jovens interlocutores da Igreja: estatuto de cidadania eclesial.
o Diretório Geral para a Catequese: inculturação e adaptação. Adolescentes juntos com crianças (ar paternal do documento). Distinguir por faixas de desenvolvimento. Orientação espiritual individualizada. Necessidade de catequistas próprios para jovens.
o Catequese Renovada: exprimir a fé com as próprias palavras dos adolescentes. (139 e 135).

“A catequese de crisma parece ser a última chance da Igreja Católica propor algo significativo aos adolescentes, criar-lhes espaço de participação e engajá-los até permanecer adultos.” (DALLA-DEA, 1999, p. 117)

• Manuais de catequese analisados: CRISMA, SACRAMENTO DA DECISÃO (Vozes), LIVRO DA CRISMA – confirmados e comprometidos (Paulus), CRESCIMENTO DO JOVEM NA CAMUNIDADE CRISTÃ (Salesiana), ENCONTROS DE CATEQUESE NAS COMUNIDADES (Paulinas), CRISMA, MEU SIM A JESUS CRISTO (Loyola).

“Pesando-se os prós e os contras, podemos ver que o mais em sintonia com as diretrizes da catequese de Crisma atual (tanto nacionais como internacionais) é LIVRO DA CRISMA, sendo seguido logo após por CRESCIMENTO. São os dois mais atualizados e mais adaptados à realidade e ao contexto urbano do adolescente atual. São os que levam mais a sério a palavra deles e os menos escolarizantes. São, em resumo, o que temos de melhor sobre catequese de Crisma até o momento, sendo que LIVRO DA CRISMA tem a vantagem de levar os adolescentes a começar a falar sua própria palavra sobre o mundo e sua fé.” (DALLA-DÉA, 1999, p. 172-173)
Todos os manuais analisados incorrem em um erro básico: só tratam do engajamento no último encontro , quando é preciso encarar o problema a partir do início: é preciso confirmar os engajados e não pensar no engajamento dos confirmados. Os encontros são encarados com a dinâmica de aula: não formam um grupo coeso, mas remetem os indivíduos, separadamente, à pessoa do catequista, assim como as aulas remetem os alunos à figura do professor. Metodologicamente, os encontros não evoluíram muito e continuam tendo como referência básica as aulas.
Como últimas conclusões, destaco:
7) A perseverança dos jovens só poderá existir se for pensada de maneira concreta. (...) É uma tarefa para ser executada em etapas, que exige método e perseverança. Formar um novo grupo de jovens ou adolescentes a partir da Crisma envolve um desafio prático-pastoral. (...)
8) Superar a falta de presença dos adolescentes após o sacramento da crisma é uma tarefa coletiva, que vai exigir esforços de todos os lados. (...) Da parte dos teólogos pastoralistas, podem ajudar criticando e colocando parâmetros para a reflexão do trabalho feito; pensando globalmente a pastoral, sem a desenraizar dos problemas e das perspectivas do povo católico brasileiro. Contudo, o grande protagonismo deve ser dado aos adolescentes, visto que todos esses grupos só poderão assessorar no processo, uma vez que ninguém poderá falar melhor aos adolescentes do que eles mesmos. É necessário deixar que os adolescentes sejam apóstolos de outros adolescentes, com queria Pio XII e o Concílio Vaticano II.”

Ou seja: como conclusão básica, acabou-se por ver que a Igreja não tem um projeto bem feito e elaborado de continuidade para os crismados. Isto não existe nem da parte dos manuais analisados, nem da parte dos documentos oficiais ou das comunidades. O que é muito triste: os adolescentes não são os culpados por não ficar na Igreja, se nem sabemos o que fazer com eles. Sem projeto, metodologia e sem espaço, a culpa de não ficarem na Igreja não pode ser jogada em cima deles.


2ª hipótese (doutorado): se os adolescentes não são os responsáveis, o que eles podem ensinar à Igreja? (Quais as expectativas deles com relação a ela?)

• Problemas de base na relação ICAR – adolescentes: confusão de linguagem e realidade; opção pelos jovens e fundamentalismo pentecostal; lógica da ruptura versus lógica da identificação; da oposição negativa até uma oposição positiva; bom-mocismo dos discursos eclesiásticos clássicos, lógica linear para pessoas de pensamento não linear; a hermenêutica do trabalho com adolescentes.
• Conceitos básicos para o trabalho com adolescentes: inculturação (Paulo Suess), adolescer da fé (Fowler), a rebeldia adolescente (Freire), método e leitura bíblica (Borán e Dick), discipulado de Cristo (Bonhoeffer), uma religião mais crítica (Comblin), cristianismo humanizador (Torres-Queiruga), o sabor necessário (Rubem Alves).
• Pesquisas com adolescentes: na rua (metrô, shopping), em colégio e na catequese. Os adolescentes nas ruas e no colégio revelaram-se bem mais críticos e mais à vontade. Na catequese, os adolescentes se revelaram mais conservadores e mais adeptos de elogios à Igreja. A comparação de ambos os resultados possibilitou a elaboração da reflexão sobre os problemas de base e sobre os conceitos teóricos mínimos para um trabalho com adolescentes crismandos. A reflexão foi evoluindo a partir da convivência (pesquisa participante) e do método indutivo de construção da teoria a partir da realidade.
• Ao par com a pesquisa empírica, fez-se uma pesquisa metodológica, usando-se o espaço e o tempo para criar algo novo. Usando-se o método de BORAN, criou-se uma catequese de crisma em 6 encontros de fim-de-semana (um a cada dois meses). O primeiro encontro para apresentar o método e fazer a primeira experiência (tema mais vocacional). O segundo, com tema mais grupal (Jesus e os apóstolos). O terceiro, focalizando o Espírito Santo e os seus dons. O quarto, focalizando a missão da Igreja na sociedade. O quinto, focalizando os sacramentos. E o sexto, depois da celebração do Crisma, para organizar um novo grupo de jovens. Este último encontro, deve ser organizado segundo a metodologia e a liderança da PJ diocesana.
• O resultado do grupo de pesquisa metodológica foi considerado bom, porque 86 % terminaram os retiros e 50% dos jovens permaneceram engajados na Igreja depois da sua confirmação, na Paróquia de Santo Inácio, em São Leopoldo – RS.
• Como o grupo foi piloto, algumas experiências precisam ser corrigidas: o custo dos encontros foi alto porque feito em casa de retiros (deveria ser feito em escola ou outro lugar mais improvisado para maior participação dos crismandos na limpeza e organização); a participação dos pais e padrinhos se limitou aos encontros no domingo à tarde (poderia ser maior na confecção das refeições diárias, ou cozinhando ou mandando pronta a comida na hora); o grupo de catequistas necessita se reunir mais de uma vez ao mês para programar os encontros (de preferência com pais e padrinhos), a comunidade cristã precisa ter uma maior participação na catequese de crisma (liturgias onde eles tenham mais participação e acompanhamento de casais jovens com pequenos grupos de 5 ou 6 crismandos).

Algumas observações.
• O conteúdo dos encontros, embora seja importante, não são definitivos. Não basta, como alguns pensam, criar uma fórmula mágica, como nos casos dos Cursilhos de Cristandade que já se tinham os “rollos” e os horários prontos e acabados. O importante não é seguir um esquema, mas criar um novo esquema de catequese de crisma, onde o protagonismo e a importância são dos crismandos.
• A metodologia de retiros periódicos cria outras possibilidades de ação e reação que os encontros semanais. Cria história coletiva (criando um grupo de vivencia, base para um novo grupo de jovens), desenvolve lideranças entre os crismandos, possibilita trabalhar com a Bíblia a partir de uma leitura libertadora e não individualista. Dá espaço para que eles tenham outras agendas em seus fins-de-semana. Possibilita espaço na comunidade para que eles possam atuar nas liturgias e ser acompanhados por jovens casais. Não cansa tanto, fazendo que o fim-de-semana dedicado ao retiro seja uma fonte de lazer e auto-conhecimento, de saída monitorada de casa (desenvolvimento da autonomia) e de exercício de liberdade e responsabilidade (tarefas divididas como limpeza, louça, quartos, salas de encontros, capela, confecção de teatros, preparação das orações da manhã e da tarde, etc.). Dá espaço para que a oração e a espiritualidade possam ser trabalhadas sem pressa e em processo participativo. Festas e recreações podem ser organizadas pelos próprios participantes.
• Uma comunidade que não queira mudar radicalmente o seu processo de catequese de crisma para adolescentes pode começar fazendo apenas 3 retiros: um no começo, um no meio e um no final do processo. Importante é criar uma história coletiva num grupo de pares iguais . Importante também é o acompanhamento do engajamento e da espiritualidade feita por casais jovens (criação de outros significativos – Cfr. FOWLER, p. 132), que permite uma acolhida e um acompanhamento personalizado. Normalmente, estes casais acabam sendo escolhidos para padrinhos destes adolescentes.
• O processo precisa de aperfeiçoamento, mas é fruto de uma caminhada de anos do autor com catequese e com acompanhamento de grupos de jovens. Não é uma teoria sem base na realidade. Muito pelo contrário, por ser uma teoria construída pelo método indutivo, demorou muito para se aperfeiçoar e vai continuar precisando de aperfeiçoamento e correções, uma vez que a realidade das comunidades e dos adolescentes é mutável. Por isto, o protagonismo deles é importante e a caminhada de planejamento e ação coletiva do grupo de catequistas é muito importante e não prescinde da comunidade maior (pais e lideranças comunitárias), o que dá ao processo todo uma característica única e concreta.

BIBLIOGRAFIA MÍNIMA:
1. AGOSTINHO – A instrução dos catecúmenos: teoria e prática da catequese, trad. do original latino e notas por Maria da Glória Novak, introd. Hugo de V. Paiva, prefácio de Frei Almir R. Guimarães, OFM. Petrópolis: Vozes, 1973. 126 p. (Coleção Fontes da Catequese)
2. BONHOEFFER, D. – Discipulado – 7ª ed. São Leopoldo: Sinodal, 2002.
3. _______________ – Resistência e submissão: cartas e anotações escritas na prisão – ed. Christian Gremmels, Eberhard Bethge, Renate Bethge e Ilse Töth, tradução de Nélio Schneider e revisão de Luís M. Sander. São Leopoldo: Sinodal, 2003.
4. BORÁN, J. – O futuro tem nome: juventude – sugestões práticas para trabalhar com jovens. São Paulo: Paulinas, 1994 (Coleção Igreja Dinâmica).
5. DALLA-DÉA, P. F. – Tornar-se adulto na fé: as diferentes propostas de continuidade e engajamento dos adolescentes urbanos nos manuais de catequese de crisma mais vendidos na Igreja do Brasil, iluminados por literatura a respeito e por documentos eclesiais. Fotocopiado. São Paulo: Faculdade de Teologia Nossa Senhora da Conceição, 1999.
6. DALLA-DÉA, P. F. – Igreja católica e adolescentes urbanos: expectativas dos adolescentes em idade de confirmação da fé, em vista da construção de um novo método de catequese crismal. Fotocopiado. São Leopoldo: Escola Superior de Teologia, 2005.
7. DUSKA, Ronald e WHELAN, Mariellen – O desenvolvimento moral na idade evolutiva: um guia a Piaget e Kohlberg. São Paulo: Loyola, 1994. 128 p.
8. FOWLER, James W. – Estágios da fé: a psicologia do desenvolvimento humano e a busca de sentido. São Leopoldo: Sinodal, 1992. 280 p.
9. JOÃO PAULO II – Exortação Apostólica CATECHESI TRADENDAE. Petrópolis: Vozes, 1980 72 p. (Documentos Pontifícios,191).
10. JOÃO PAULO II – Exortação Apostólica CHRISTIFIDELIS LAICI. São Paulo: Paulinas, 1989. 192 p.
11. PAULO VI – Exortação Apostólica EVANGELII NUNTIANDI. São Paulo: Paulinas, 1995 120 p. (A Voz do Papa, 85).
12. TILLICH, P. – Dinâmica da fé - 6ª ed. – trad. Walter O. Schlupp. São Leopoldo: Sinodal, 2001.

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