quinta-feira, 11 de junho de 2015

PARADA GAY 2015

O jornal O DEMOCRÁTICO (http://www.jornalodemocratico.com.br/2011/) me pediu a minha opinião sobre a PARADA GAY desse ano. Devo começar dizendo que não vi nem acompanhei nada. Estou em Trezena de Santo Antônio há dias e tenho visto quase nada de Internet e notícias nesses dias. Não escrevo esse texto como uma voz da minha Igreja. Temos documentos e pessoas autorizadas para falar. Escrevo essas linhas como cristão, sobretudo. Mas tenho uma posição que exige um pouco mais de tempo e reflexão para o tema:
  • 1.       Os LGBT cultivam uma cultura de identidade, ou seja: eles querem ser e continuar gays e serem respeitados por isso. Não vejo onde isso poderia ofender alguém, mesmo sendo hétero. Cada um que seja o que é, do jeito que é e que seja responsável por sua vida e seus atos, diante de si mesmo, diante de Deus e diante da sociedade. Respeito é essencial para todos: negros, asiáticos, imigrantes, gays, héteros, ricos ou pobres, homens e mulheres.... Aliás, isso é bem cristão: São Paulo já disse que como estamos em Cristo não há mais separação, a mesma fé e a mesma salvação nos une (Galatas 3, 27-29) E isso parece básico: antes de ser gay ou hétero sou humano e sou cristão, isso nos une e nos possibilita ser irmãos.
  • 2.       A atual sociedade midiática vive da cultura do escândalo, quanto mais polêmica, mais consome e lucra. Então, o que os gays fazem todo ano na Parada (que é um carnaval fora de época) é polemizar e fazer gestos que causem impacto visual e dê polêmica. Assim, eles aparecem e chamam a atenção para a causa de defesa de seus direitos. Para mim, acho que muitos exageram e são desrespeitosas. Nem posso considerar que todos sejam cristãos, muitos não são nada e nem entendem nada de cristianismo. Mas nem por isso, eu como cristão posso ameaçar de morte ou ser violento com os que me desrespeitam. O mandamento do amor é esse: Nisso conhecerão que são meus discípulos, se vocês amarem uns aos outros COMO EU VOS AMEI (Jo 13,35). E Cristo morreu por todos (inclusive por Judas, depois de lavar os seus pés e dele o trair...). Um cristão não tem o direito de bater ou de ameaçar um gay ou um inimigo, a partir desse momento ele nem é mais cristão...
  • 3.       Contra a cultura do escândalo, a única solução é não comprar a polêmica. Funciona como piada: se não dou risada de uma piada preconceituosa, o contador acaba parando de contar e mudando de assunto. Mas se eu fico bravo, então as pessoas riem de mim... E o assunto não acaba mais.

  • 4.       Há gays e gente religiosa em toda parte, na Igreja e fora da Igreja. E isso não é para ser ruim ou bom. Temos que ver se a pessoa é ética, se é justa, se não prejudica o outro, se a sua fé ajuda a construir ou se é apenas uma fé combativa que gera violência. Mais do que saber por onde se sente prazer, temos que saber se o comportamento é construtivo ou destrutivo de si e dos outros. É o caráter que define uma pessoa e não a sua orientação sexual. Jesus falou muito pouco sobre sexo, mas falou muito sobre amor, sobre não violência e sobre respeito. São essas atitudes de Jesus que deveriam nos inspirar hoje... E Jesus também disse que não devemos julgar o outro, porque quando o fazemos, tomamos o lugar de Deus (Lc 6,37 e Mt 7,1). Ele é o único juiz, não nós... Isso também vale pra gays e para héteros...
  • 5.       A Igreja deve ser criticada, não só a católica. Embora ninguém goste de ser criticado, todos nós podemos sê-lo e em muitas vezes, isso nos ajuda a crescer. Ora, se você é batizado, crismado e fez a primeira comunhão, você é Igreja. Com todo direito. E com todos os deveres, incluindo ler a Bíblia e praticar o amor a todos, até aos inimigos. Os gays estão excluídos do amor? Sei que muita vez, o que se fala da Igreja são apenas chavões e muita coisa sem pé nem cabeça, como quando se fala da Idade Média. É fácil falar daquele tempo vivendo hoje. Ou é fácil criticar os gays sendo hétero... Às vezes precisamos ser mais misericordiosos e menos orgulhosos, todos nós. O papa Francisco já disse que ele não é ninguém pra julgar uma pessoa que é gay, mas procura Deus. Você é maior do que o papa ou quer se igualar a Deus, nosso supremo Juiz? Se a Igreja sou eu e é você, podemos ser criticados e devemos evoluir e mudar, nos converter. O mundo pode ficar melhor...
  • 6.       Como fui contatado para escrever esse texto, fui procurar na Internet fotos e reportagens da Parada Gay e achei gente religiosa (gay e hétero) que estava lá por causa do amor ao próximo pregado por Jesus. Inclusive um grupo de religiosos das mais diversas Igrejas, incluindo a católica que pedia perdão pela atitude intolerante de muitos cristãos. Vi depoimentos de gays que chegaram e choravam aos pés desses religiosos dizendo que amavam a Igreja, mas tinham raiva das pessoas que os desprezavam. Não podemos esquecer que Jesus disse que veio para os doentes e não para os sãos... (Mt 9, 11-13) A Igreja é um grande hospital de campanha que deve acolher TODOS os feridos e não escolher alguns e desprezar os outros. O Evangelho a todos os questiona e deve gerar em nós atitudes de conversão e mudança de vida.
  • 7.       Dizer que alguém foi crucificado é uma expressão própria dos católicos e não sei se os evangélicos entendem isso bem, em todos os significados... Dizer “fulano está sendo crucificado” ou dizer “sicrano foi pego para Cristo” é uma maneira de dizer e de falar que exige um contexto católico. Então, a moça que encenou a crucificação dos gays estava sendo mais católica do que muitos que hoje a criticam. Já vi tanta gente colocada na cruz que isso não me escandaliza... Apenas chama a atenção para o Calvário de dores que um gay pode sofrer passando pela rua e ser atacado por alguém que nunca viu apenas por ser o que é...
  • 8.       Quem celebra o Corpo de Cristo (Corpus Christi) tem que ter mais respeito pelo corpo macerado do Cristo que se deu por nós na Eucaristia, mas também tem que respeitar o corpo do outro como lugar de santidade. Pelo Batismo, todos carregamos a Trindade Santa em nós e o modo como cada um trata o próprio corpo e o corpo do outro é sinal de salvação ou de condenação. Mas isso é problema que cada um terá que enfrentar com Deus face a face. Eu não tenho nem a possibilidade de ser cristão e de falar da sexualidade do outro, que é assunto íntimo e pessoal. Cuide da sua, porque o corpo de Cristo e ou seu sangue correm em mim e em você. Incluindo muitos nossos irmãos de fé, que são gays ou héteros...
  • 9.       Por fim, mais do que condenar e comprar uma polêmica, acredito em rezar pelo outro, em respeitá-lo e em amá-lo. Se o outro me procura, posso falar com amor o que penso e o que acredito. Mas nunca terei a chance de ser violento, de condenar, de humilhar ou de ameaçar ninguém. Ou nem serei cristão. Gosto muito de Cristo e me inspiro nele para o meu agir. Antes de condenar, é preciso amar com todo o ser, não foi essa a atitude de Cristo que morreu na cruz até por Judas que o traiu? O resto é mesmo assunto que não me diz respeito.


PAULO F. DALLA-DÉA
cristão e padre
(P. S.: Tento ser tudo isso, não sei se consigo,

mas sei que preciso me esforçar mais)

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